quarta-feira, 30 de março de 2011

Ao cair da noite

Enquanto passeio os olhos pelas notícias pouco informativas que aparecem quando fecho meu e-mail, me deparo com as narrativas em torno da morte do nosso ex-vice-presidente. E confesso que admirei sua coragem, suas palavras frente à doença, o grande ânimo com que se apresentava. Lendo os comentários postados pelos leitores da mesma exígua notícia, sou informada de que este homem que tantos elogios arrancara de seus compatriotas políticos - pois sim, que parece que eles vivem em outro país que não o meu ou o seu, em que problemas reais acossam os pobres - deixou ordens expressas para ser cremado, a fim de evitar disputas judiciais por seu bens com o não-reconhecimento da paternidade de uma filha.
Embora ache estúpido o esdrúxulo argumento do leitor (uma ordem do juiz manda tirar um fio de cabelo do parente mais próximo e o DNA está provado por meios indiretos, sem sombra de dúvida razoável), quedo-me a pensar no que anda acontecendo...
Tenho medo de parecer moralista. Eu sou um pouquinho, na verdade... É que nos dias atuais qualquer ilusão poética sobre a vida, qualquer perspectiva de altruísmo vira fanatismo, romantismo, idealismo ou moralismo, como queiram...
A imagem distorcida que eu guardo do passado, embora fora de foco, me traz uma sensação de um tempo em que palavras como honra e respeito tinham significado, até certo ponto, espiritual. Um homem deveria ser capaz de reconhecer seus erros, assumir seus equívocos. Não deveria ser preciso um atestado científico de paternidade se o dito cujo tivesse tido o respeito mínimo por todas as mulheres que cruzaram seu caminho, incluindo a esposa e a tal amante eventual. Mas, agora, a outra é a prostituta. E ele? Joguem pedra na mulher, já dizem desde os tempos de Jesus. Prostituta é ela, ele é pai de família...
Não sei o que anda acontecendo, mas parece que estamos perdendo todo o senso de limites, de verdade, de honradez. Infelizmente, os que gostamos de nos colocar como "os santos do mundo" não estamos distantes desta mesma e  triste realidade paralela dos políticos brasileiros. A Palavra de Deus é outra, no sentido de alteridade mais profunda e distanciada que se possa ter da vida das pessoas... Daí honrados homens religiosos que se envolvem em escândalos sexuais ou que, às escondidas, espreitam meninas desavisadas. Ou meninos. Sobram dores, falta o amor imaculado exemplificado em Cristo, estrupiado por lobos vorazes de plantão. Sobram lágrimas, faltam afagos. Falta autenticidade, pululam máscaras.
Meu Deus, como dói...
Pois, querida filha mal-amada de José de Alencar, não se preocupe. Se ele não foi homem o bastante para assumir a paternidade, certamente, não importa quem ou como você seja, você não perdeu grande coisa. Quem não tem algo de valor para dar acaba dando prejuízo. Certo estava Karl Barth. Exemplo de Pai é Deus. Deveríamos comparar os demais a Ele e não o contrário... devemos voltar à analogia da fé em nossa forma de ver o mundo. Devemos nos arrepender. Dizemos que estamos vendo, mas tateamos nas trevas de nosso egoísmo. Morremos. Somos enterrados com pompa, honra, discurso e circunstância. Mas, no fim, como nos lembra o Cristo da ressurreição, pobres e ricos apodrecem sob a mesma terra. Somente a remissão eterna pode nos dar esperança.

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